Seriguela (Spondias purpurea)
Há frutas que carregam memórias. A seriguela é uma delas. De cor vibrante e polpa dourada, ela pinta o chão dos quintais nordestinos no verão, exalando um perfume doce que anuncia a estação da fartura.
É pequena, mas poderosa. Seu gosto mistura o azedinho da infância com a doçura da terra fértil — um lembrete de que a simplicidade também é uma forma de abundância.
Quem a conhece nunca esquece. E quem ainda não provou dificilmente imagina que em um fruto tão pequeno cabem tantas histórias, nutrientes e significados.
Principais destaques:
- Fruta tropical rica em vitamina C e ferro
- Cultivo rústico e adaptável ao clima quente
- Sabor doce e ácido, ideal para sucos e compotas
- Forte presença cultural no Nordeste e Centro-Oeste do Brasil
Origem e características botânicas
A seriguela é o fruto da Spondias purpurea L., uma árvore da família Anacardiaceae, nativa da América Central e do Norte da América do Sul, que encontrou no Brasil um solo perfeito para prosperar. Seu nome vem do tupi “siriguêra”, que significa “fruta pequena amarela”.
A árvore pode atingir de quatro a sete metros de altura, com tronco tortuoso e copa densa, e prefere climas tropicais secos e solos leves. Seus frutos são ovais, com dois a quatro centímetros de comprimento, variando do amarelo-alaranjado ao vermelho intenso quando maduros. A polpa é macia, fibrosa e extremamente aromática — lembrando o perfume de mel e flor-do-campo sob o calor do sol.




Compostos ativos e propriedades nutricionais
Pequena no tamanho, mas rica em nutrientes, a seriguela se destaca por seu alto teor de vitamina C, ferro, cálcio, fósforo e antioxidantes naturais.
A fruta possui compostos fenólicos e carotenoides que auxiliam na proteção das células contra o envelhecimento precoce e fortalecem o sistema imunológico. Seu índice de açúcares naturais é equilibrado, o que a torna uma excelente fonte de energia rápida e natural.
Pesquisas apontam ainda que a polpa contém antocianinas e ácido ascórbico, com potencial anti-inflamatório e regenerador celular, além de contribuir para a saúde cardiovascular e digestiva.
Bloco acadêmico
Estudos realizados pela Embrapa Agroindústria Tropical e publicados no Brazilian Journal of Food Research (2021) destacam o alto valor nutricional da Spondias purpurea, especialmente em polpas congeladas utilizadas em programas alimentares no Nordeste.
Os pesquisadores observaram atividade antioxidante superior a 70% e teores expressivos de compostos fenólicos, sugerindo potencial para uso funcional em alimentos e cosméticos naturais.
Apesar de sua riqueza biológica, a seriguela ainda é considerada uma fruta subutilizada — um tesouro tropical à espera de reconhecimento científico e gastronômico mais amplo.
Classificação botânica e dados científicos da espécie
Nome científico: Spondias purpurea L.
Família: Anacardiaceae
Gênero: Spondias
Nomes populares: Seriguela, Siriguela, Ciriguela, Ciroela, Cajá-roxo, Taperebá-roxo
Origem: América Central e Norte da América do Sul (México, El Salvador, Nicarágua, Colômbia e Venezuela)
Distribuição no Brasil: Predominante nas regiões Nordeste e Centro-Oeste; também cultivada em Minas Gerais e norte de São Paulo
Habitat natural: Caatinga, cerrados e áreas semiáridas; ocorre espontaneamente em terrenos arenosos e margens de matas secas
Tipo vegetal: Arbórea frutífera decídua
Altura média: 4 a 7 metros, podendo alcançar até 10 metros em solos férteis
Diâmetro da copa: 3 a 5 metros, com ramificação irregular e tronco tortuoso
Folhas: Compostas, alternas, com 9 a 19 folíolos de formato elíptico-lanceolado; superfície lisa e verde-intensa; queda total durante a estiagem
Flores: Pequenas, arroxeadas ou rosadas, reunidas em panículas terminais; florescem no final da estação seca
Frutos: Drupas elipsoides de 2 a 4 cm de comprimento; casca fina e lisa, variando do amarelo-alaranjado ao vermelho-purpúreo; polpa suculenta, fibrosa, de aroma adocicado e sabor agridoce
Semente: Única, lenhosa e rugosa, envolta em fibras aderentes
Floração: Entre setembro e dezembro, conforme o regime de chuvas regionais
Frutificação: De dezembro a março, com maturação rápida e coloração intensa
Polinização: Entomófila, realizada principalmente por abelhas e pequenos insetos
Dispersão: Zoocórica, facilitada por aves e mamíferos frugívoros
Composição química predominante: Vitamina C (ácido ascórbico), ferro, cálcio, fósforo, antocianinas, carotenoides, ácido gálico, ácido ferúlico, quercetina, compostos fenólicos totais (~180 mg GAE/100g de polpa)
Atividade biológica: Antioxidante, anti-inflamatória, adstringente, digestiva e remineralizante
pH do solo ideal: Levemente ácido a neutro (6,0 – 7,0)
Exigência hídrica: Baixa; planta adaptada ao estresse hídrico prolongado
Luminosidade: Sol pleno; necessita de alta radiação solar para frutificar com intensidade
Propagação: Por sementes, estacas lenhosas ou enxertia; boa taxa de enraizamento em substrato arenoso e drenado
Tempo de produção: De 3 a 5 anos após o plantio, em condições favoráveis
Expectativa de vida útil: Superior a 25 anos em ambientes tropicais
Curiosidades genéticas: Apresenta ampla variabilidade morfológica; existem formas diploides e triploides naturais; espécies próximas como Spondias mombin e Spondias dulcis cruzam espontaneamente, gerando híbridos rústicos
Importância econômica: Fruto de consumo regional e potencial exportação; base para polpas congeladas, sucos e produtos cosméticos naturais
Referências acadêmicas:
– Embrapa Agroindústria Tropical, Relatório Técnico 2021
– Brazilian Journal of Food Research, vol. 8, n.3 (2021)
– Departamento de Química da UFPE, Estudos Fitoquímicos 2022
– Flora do Brasil 2020 (JBRJ)
A Spondias purpurea representa a expressão biológica da resiliência tropical: um organismo adaptado à escassez, capaz de frutificar mesmo sob seca prolongada. Essa plasticidade ecológica, aliada à riqueza fitoquímica e à forte presença cultural, torna a seriguela uma das espécies-chave da alimentação nativa brasileira.
Variedades e diversidade genética
A Spondias purpurea apresenta uma notável diversidade morfológica. Existem variedades silvestres e cultivadas que diferem no tamanho, na coloração e na textura da polpa. Algumas produzem frutos mais alongados e de sabor intenso, enquanto outras geram versões menores e adocicadas, conhecidas como seriguelas-de-quintal.
Nos estados do Nordeste, observa-se também a presença de linhagens híbridas, resultado de cruzamentos espontâneos entre Spondias purpurea e espécies próximas, como Spondias mombin. Essas formas híbridas geram frutos mais fibrosos e resistentes à seca, embora menos doces.
Pesquisas genéticas conduzidas pela Universidade Federal de Pernambuco vêm mapeando essas variações e identificando genótipos promissores para o cultivo comercial sustentável. Essa diversidade é o que mantém viva a espécie — uma expressão da própria adaptação da natureza aos climas áridos do semiárido brasileiro.
Benefícios e usos práticos
A seriguela atua como um verdadeiro tônico natural. Seu consumo regular ajuda a fortalecer o sistema imunológico, combater a anemia e a fadiga, melhorar a digestão e hidratar a pele.
Na medicina popular, é utilizada para aliviar dores de estômago, cólicas e fraqueza. Já sua casca e folhas são aproveitadas em infusões e compressas com propriedades adstringentes.
O sabor adocicado com leve acidez também estimula o apetite e proporciona sensação de bem-estar — razão pela qual é chamada em algumas regiões de “fruta do vigor”.
Cultivo e cuidados
A serigueleira é uma planta rústica, resistente à seca e de fácil propagação. Multiplica-se por estacas ou sementes e se adapta bem a regiões de clima tropical e subtropical.
Prefere sol pleno, solos bem drenados e regas moderadas, pois o excesso de umidade pode apodrecer as raízes.
Floresce no final da estação seca, e seus frutos amadurecem no início das chuvas, entre dezembro e março, colorindo as paisagens rurais e atraindo abelhas, pássaros e pessoas.
Mesmo após a queda das folhas, a árvore pode florir e frutificar, simbolizando resiliência e renovação cíclica.
Usos gastronômicos e culturais
A seriguela é consumida in natura, mas seu sabor intenso inspira receitas que vão de sucos, sorvetes e geleias a licores artesanais e vinhos de fruta.
Em várias regiões do Nordeste, é tradição colher as frutas diretamente do pé e saboreá-las ainda mornas do sol, em uma celebração silenciosa da natureza. É também ingrediente de compotas caseiras e doces típicos que guardam o sabor das festas juninas e dos verões de infância.
Seu perfume é tão marcante que já inspirou perfumes artesanais e velas aromáticas, lembrando a brisa quente das tardes tropicais.
Curiosidades e simbolismo
A seriguela representa vitalidade, simplicidade e fartura, sendo vista como um símbolo de prosperidade e alegria rural.
Nas culturas indígenas e afro-brasileiras, a árvore é associada à energia solar e à fertilidade da terra.
É comum encontrá-la nos quintais de famílias antigas, cultivada como herança afetiva — uma árvore que atravessa gerações, oferecendo sombra e doçura em igual medida.
Veja também: CAJÁ MIRIM: O Fruto Pequeno que Encanta pelo Sabor e Benefícios
Última folha
A seriguela é a fruta que traduz o calor em forma de afeto. Um presente da terra, doce e resistente, que floresce sem pedir licença e frutifica quando o sol parece mais forte.
Em cada mordida, há o sabor do tempo — do chão quente, do vento e da memória.
Algumas frutas não alimentam só o corpo, mas também o que somos quando lembramos de onde viemos.
Com folhas pequenas e sonhos grandes, dall.conecta